RESENHA #237: NEM TUDO SÃO ROSAS…

AUTORA: Rachel Givney
SINOPSE: A Jane Austen que conhecemos hoje nunca se casou. Mas, em 1803, aos 28 anos e temendo se tornar uma solteirona convicta, nossa protagonista, então uma aspirante a escritora, está decidida a encontrar um marido. Graças a um misterioso casamenteiro, o que ela imaginava ser uma tarefa simples acaba se tornando uma viagem no tempo até a Inglaterra dos dias atuais.
Jane fica encantada ao descobrir que se tornou uma escritora mundialmente famosa, mas tudo muda quando ela se apaixona por um homem moderno: à medida que o romance floresce, a jovem autora deixa a escrita em segundo plano, e seus livros começam a desaparecer das prateleiras. Agora, ela precisará escolher entre viver o amor no presente ou voltar ao seu tempo para se dedicar à carreira de escritora e se tornar a inesquecível Jane Austen.

Nós sabemos que a humanidade evoluiu e, pouco a pouco, as regras impostas vem mudando. Nós, mulheres, não somos mais obrigadas a vestir roupas desconfortáveis, podemos usar calça, falar sobre temas diversos, ter nosso próprio dinheiro e muitas outras coisas. Mas, é claro, nem tudo são rosas.

A estrutura patriarcal se mantém por mais que lutemos contra ela. Nossos salários ainda são desiguais e somos julgadas pela aparência. Aliás, mesmo na cinematografia, podemos observar que atrizes mais jovens geralmente fazem o papel de mulheres mais velhas. As mulheres mais velhas são jogadas para escanteio. Existem aquelas que não, mas a maioria ainda é, diferente dos homens.

Jane apaixonada trabalha fortemente a questão do feminino. Através de Jane e Sofia, passado e presente, podemos observar aquilo que a mulher enfrentou antes e ainda enfrenta. Não obstante, a escritora vai utilizar esse machismo para falar sobre o desejo pelo matrimônio e também pela importância da carreira para uma mulher.

A maioria das mulheres no decorrer da história teve que optar por seu marido e sua família em oposição a sua carreira. O mundo vem mudando, mas isso não impede, até hoje, que mulheres tenham que tomar essa decisão. Assim, ao tratar do feminino, Givney acerta muito ao colocar essa problemática como tema central da sua narrativa, pois Jane precisa optar pelo amor na Era Moderna e sua carreira como escritora de fama internacional.

Com uma escrita leve, a narrativa simula, em partes, tanto a vida de Jane Austen quanto a história de Persuasão, baseada nos dramas do passado da escritora. Também traz algumas curiosidades, como o anel que foi leiloado anos antes. Também trabalha relacionamentos, como eles podem ser positivos ou não; o ambiente cinematográfico e seus problemas; a diferença entre as épocas e a sua similitude, utilizando Bath como cenário.

Contudo, da mesma maneira que o machismo estrutural ainda nos cerca, nem tudo são flores na construção desse título. A premissa é incrível, sem sombra de dúvida, pois ela é uma crítica direta a quão pouco sabemos de Austen porque mulheres não importavam, diferente dos autores do passado. Também é um livro recheado de críticas e temas importantes, com partes bem desenvolvidas, até porque Givney é cineasta. No entanto, o desenvolvimento é, infelizmente, muito mal feito.

Com quase quatrocentas páginas, o livro poderia ter mais relevância e ser melhor construído com a metade disso. Infelizmente, cineastas e roteiristas continuam a acreditar – e me parecem que não estudam – que produzir literatura é como construir um roteiro com seus atos. Há semelhanças, mas a forma como se comportam é muito diferente entre si. O relacionamento do casal principal soa sem pé nem cabeça (proposital para o desfecho); há erros nas explicações e no desenvolvimento de viagem no tempo; a quebra do fluxo da narrativa é ruim; os acontecimentos em si soam confusos e incoerentes com o que foi apresentado pelos personagens no decorrer da história. Esse título é o exemplo perfeito de que menos é mais.

Contudo, também é necessário levar em consideração que é um romance leve e descontraído. Há situações que me fizeram rir (embora soassem inacreditáveis também). Assim, se você busca uma leitura despretensiosa, você pode acabar se apaixonando como a Jane Austen.

A tradução é de Lígia Azevedo e há algumas passagens truncadas e erros incômodos (ou foi porque prestei muita atenção neles); a capa tem um tom de verde suave que contraste belamente com o rosa. A diagramação é super confortável e segue o padrão da Gutenberg.

 

REFERÊNCIA

GIVNEY, Rachel. Jane apaixonada: E se Jane Austen pudesse viajar no tempo e se apaixonar?. Tradução de Lígia Azevedo. São Paulo: Gutenberg, 2022.