RESENHA #169: O MISTÉRIO DA PERGUNTA

AUTORA: Agatha Christie
SINOPSE: Após uma tacada especialmente ruim, Bobby Jones lança sua bola de golfe em um precipício. Ao procurá-la, encontra um homem acidentado que parece estar em seus momentos finais. Pouco antes de morrer, o moribundo abre os olhos e proclama suas últimas palavras: “Por que não pediram a Evans?” Assombrados pela pergunta, Bobby e sua amiga Frankie tentam descobrir quem é Evans e o que exatamente não lhe foi pedido. Porém, os dois logo percebem que, por mais que não sejam detetives profissionais, os perigos dessa investigação são muito reais…

Quando pensamos em um romance policial, muitas das vezes nos preocupamos em descobrir sobre quem é o assassino, quem é o assassinado e qual é a arma do crime. Às vezes, o que mais nos importa é a motivação ou o modo como tudo aconteceu.

No caso de Por que não pediram a Evans?, acredito que nenhum desses fatos seja mais relevante do que compreender essa pergunta. Ela, inclusive, possui dois desdobramentos: Não pediram o quê? E quem é Evans?

Por mais que soe óbvia e clichê a resposta para as perguntas geralmente essenciais, Christie está muito mais preocupada em desenvolver e resolver o mistério do questionamento título do que o que aconteceu com Bobby e o que ele está tentando resolver a priori. Ainda que o crime também seja interessante de acompanhar, já que conta com personagens divertidos e carismáticos.

A pergunta nunca deixa as páginas e nem a mente dos personagens, sempre sendo retomada em momentos importantes. Além disso, muitos dos fatos apresentados no início do mistério se relacionam mais ao questionamento do que ao crime que vai sendo interrogado no decorrer das páginas. Contudo, justamente por serem detalhes desinteressantes para a construção do crime, eles passam sem que percebamos.

Por conta disso, existe a possibilidade de que a resolução de Christie pareça mirabolante e pouco desenvolvida, porém, por mais que peque nas regras de Van Dine e de Knox, a escritora constrói uma história bastante concisa. Entretanto, há dois problemas nessa construção: só no final todo o contexto ganha sentido tanto para o leitor quanto para os personagens-detetives. Sendo assim, por mais que leitor e detetives estejam páreo a páreo, acredito que Christie poderia ter dado uma pequena informação essencial bem antes.

Não menos importante, ela utiliza claramente Deus ex machina para resolver uma situação, o que faz com que, em quesitos de construção, a trama não seja uma das melhores da Rainha do Crime. Assim, ao usar esse recurso, um elemento inesperado por não ter sido outrora mencionado, a autora peca no desenvolvimento do seu romance policial.

Para compensar, Christie traz algumas críticas bastante contundentes sobre as relações entre classes sociais, bem como trabalha relações parentais, seja entre pais e filhos, irmãos e matrimônio. Somado a isso, trata de aspectos econômicos, sociais e de urbanismo da Inglaterra, também falando sobre o uso de drogas ilícitas, percepção sobre a medicina, em destaque, a psiquiátrica.

A nova edição da Harper Collins conta com uma ótima diagramação, tendo espaçamento e letras de tamanho adequado. A tradução de Érico Assis é de qualidade, tendo poucos erros de revisão na edição. Sendo capa dura e com estilo minimalista, segue o resto da coleção.

REFERÊNCIA

CHRISTIE, Agatha. Por que não pediram a Evans? Tradução de Érico Assis. 1ª ed. Rio de Janeiro: Harper Collins, 2021.