QUER DICA? #05: ANNE WITH AN E

Uma protagonista de cabelos ruivos, hoje, é muito mais comum do que antes, justamente pelo estigma enraizado socialmente em períodos anteriores da história. No entanto, Anne de Green Gables, desde o momento que foi publicado, ganhou atenção do público e se tornou um best-seller, contando a história de uma menina cativante e tagarela.

Muitas adaptações da obra de Lucy Maud Montgomery foram ao ar, no entanto, a mais duradoura foi Anne with an E, produzida pela CBC em parceria com a Netflix. No entanto, a série durou somente 3 temporadas, tendo sido cancelada por falta de audiência.

Anne e a sua história estão presentes em nove dos muitos livros publicados pela a autora, embora seja protagonista de apenas seis. Conhecendo um pouco dessa obra, que tal investigarmos cinco diferenças entre elas e Anne with an E

 

01. ANNE E O ORFANATO

 

Anne foi um engano, Marilla e Mathew precisavam de um menino para cuidar da lavoura, por isso, a chegada de uma garota foi uma surpresa. Marilla tenta realmente verificar o que aconteceu enquanto pensa se vai devolver a menina. Contudo, ela resolve – após conhecer a possível substituta família – ficar com Anne, não há nada sobre devolver para o orfanato por um possível furto.

A série resolveu misturar duas partes do livro: a chegada de Anne com o desaparecimento do broche em um só, para causar mais emoção. Dessa forma, com exceção das primeiras cenas, a história de Anne muda completamente.  

 

02. ACEITAÇÃO DE ANNE SHIRLEY

 

Na série, Anne passa por muitos problemas de aceitação, sendo realmente querida – a princípio – só por Diana, já que ela tinha cabelos ruivos e também era adotada. Sua presença é muito polêmica na proposta do seriado, até porque Marilla tenta devolvê-la para o orfanato.

Contudo, no livro, é muito diferente. Não só Marilla não tenta devolvê-la, como a presença inicial de Anne é notada na catequese (ela possui aulas na escola e na Igreja). Assim, por mais que as meninas estranhem o seu jeito, a menina órfã chama muita atenção e faz amizade com todos logo. Nenhuma amizade igual a que ela tem com Diana, claro.

 

03. ANNE SHIRLEY

 

Na série e no livro, Anne Shirley é uma personagem viva e que oscila muito em suas emoções, também é inventiva e esperta, o que a atriz Amybeth McNulty conseguiu interpretar muito bem. No entanto, Anne Shirley jamais responde Marilla e nunca mente para a sua família. Ela é íntegra e honesta todo tempo, algo que não acontece na série.

A personalidade da protagonista se modifica na medida em que os acontecimentos série x livro se desassociam. Anne, nos livros, torna-se mais religiosa até por conta das influências; enquanto, na série, com uma proposta mais atual, vira um símbolo feminista “mais radical” para o período (ainda que, nos livros, ela também o seja).

 

04. GILBERT BLYTHE

 

Nos livros, os primeiros anos de Anne com Gilbert são complicados, justamente porque Anne não fala com ele. Entretanto, ambos acabam competindo para ver quem é o primeiro lugar da turma e de todas as atividades: Anne motivada por rancor; Gilbert por sua paixão pela protagonista. Montgomery deixa bem claro, desde a metade do primeiro livro, que Gilbert gosta de Anne. Com o decorrer dos anos, é possível notar que ela também passa a gostar dele.

Durante esses anos iniciais, o rapaz tenta fazer diversas aproximações sem sucesso. Chega a pedir desculpas pela última vez, porém, Anne não aceita e se arrepende logo em seguida. Só voltam a se falar quando ele cede a posição como professor para que ela fique em Greens Gables.

O rapaz, na série, é completamente diferente. Ele não viaja, não perde o pai, nem nada disso. Na verdade, o personagem do seriado, ao apresentado no início das obras de Montgomery, é muito mais presente. Anne e ele logo fazem trégua, conversam, entendem-se e sua competitividade é pouco sentida. 

 

05. TEMAS LGBTQ+ E RACIAIS

 

Ao contrário dos livros escritos e publicados em 1900, a série é contemporânea. Dessa maneira, o roteiro aborda questões relevantes e importantes do nosso período, como, por exemplo, os temas sexuais e raciais.

Tia Jo, Josephine Barry, na série, é apresentada como lésbica enquanto Cole é gay, personagem que não existe nos livros. Por mais de um episódio, encontramos insinuações e questões referentes a essa temática. Da mesma maneira, é possível encontrar questões raciais, apresentadas por Sebastian e Marry, relembrando a presença dos escravos e de como eles eram vistos na sociedade; e também em relação aos indígenas (que o final da série deixa a desejar).

Ambos os núcleos são importantes para mostrar: (1) como o período histórico de Anne Shirley era preconceituoso; (2) como os personagens principais estão a frente de seu tempo; e (3) a importância dessas questões na sociedade de ontem e hoje.

 

BÔNUS: QUEEN’S ACADEMY

 

No seriado, encontramos a Queen’s Academy como uma universidade, porém, nos livros, a Queen’s é um colégio – fazendo uma comparação conosco – como se fosse um Ensino Médio e não, uma universidade de ensino superior.

Nos livros, Anne e Gilbert são os únicos a ficarem na mesma sala e competindo, como sempre, o primeiro lugar. Só que, por ser um colégio maior, outros vão entrar no páreo. Essa diferença se soma também a presença prolongada do Mr. Phillips – que fica só um ano e não tem o plot LGBTQ+ também – e de Muriel Stacy (revolucionária nos livros, mas não tanto quanto na série). 

 

A diferença entre os livros e a série é gritante. Na verdade, muito da série não existe nos livros – o que torna uma inspiração mais do que uma adaptação. No entanto, deve-se ressaltar que a maioria das mudanças fazem sentido para nosso período histórico que observa detalhes como a luta pelos direitos femininos, a desigualdade racial e o preconceito geral contra minorias, como os LGBTQ+.

Montgomery observa a figura feminina nas suas obras e mostra a desigualdade, bem como tem um espírito revolucionário. Só que muito diferente do apresentado na série e mais comedido (até por questões de período).

Há diferenças ótimas, há diferenças ruins. Anne Shirley, no livro, é mais cativante; mas Gilbert ganha todo o destaque na série. Há incongruências no seriado que não estão nos livros, como Anne não saber o que é menstruação (e outros fatores históricos). É uma boa pedida para quem quer conhecer um pouco da província canadense e de Anne, mas com um final mal acabado por conta do cancelamento.