QUER DICA? #04: THE WITCHER

Embora a hype – ou, ao menos, boa parte dela – da série The Witcher já tenha passado, nós não vamos deixar de fazer alguns apontamentos importantes. Muitos fãs começaram a ler e investigar as obras de Andrzej Sapkowski por conta do seriado; outros, por sua vez, vão esperar para conhecer mais das aventuras de Geralt quando Henry Cavill voltar para o papel em 2021.

Tal saga contém nada mais e nada menos do que sete livros, ou melhor, oito, já que o último volume A Senhora do Lago foi dividido em parte 1 e 2. Sendo assim, queremos mostrar o quão melhor é ler os livros e por qual razão eles são muito mais legais do que a série (mas não necessariamente o jogo). 

 

01. A PRESENÇA DE CONTOS DE FADAS

 

No primeiro episódio do seriado, conhecemos a personagem Renfri, uma misteriosa e, possivelmente, amaldiçoada mulher. Nesse capítulo, baseado em um dos contos de O Último Desejo – mas não o primeiro deles, já que este pertence a Estrige –, tão icônico pela fala do Geralt sobre o mal maior e menor, sabemos que ela é a Branca de Neve. Ou melhor, a representação dela na leitura do Sapkowski.

Na conversa que ocorre na torre onde Stregobor se esconde, o personagem a associa aos sete anões e também à maçã envenenada, além da madrasta. Contudo, a série optou por cortar essas múltiplas referências, deixando somente o peso maligno que a madrasta exerceu sobre a vida da garota.

 

02. PRIMEIRO ENCONTRO ENTRE CAHIR E CIRI

 

A diferença mais ousada – para não dizer absurda – entre a série e os livros pertence ao arco da Ciri, o qual foi completamente modificado (para pior). O encontro dela com o homem de penacho é explicado por ele – seu nome é Cahir – bem mais à frente nos livros, momento em que ele ganha destaque entre Batismo de Fogo e A Torre da Andorinha. Nesse encontro, Ciri não abriu a terra e nem fugiu dele daquele modo, pelo contrário, ficaram um curto período de tempo juntos ao ponto de o personagem ter que cuidar da futura bruxa. Ela jamais esqueceu o dia do massacre e o associava a Cahir, no entanto, o seriado optou por uma versão fanática dele, o que dá a entender que seu arco também será completamente diferente.

 

03. CASAMENTO DE PAVETTA

 

Em uma das partes mais interessantes da obra, encontramos diferenças singulares no casamento da mãe de Ciri. Primeiro, Jaskier não está presente na cerimônia, muito menos foi convidado para tocar ou cantar; na verdade, a presença de Geralt é solicitada pela monarca Calanthe, por motivos, a priori, desconhecidos pelo bruxo. Contudo, ele foi contratado para estar ali – e não como guarda-costas do amigo.

O bruxo, inclusive, não é reconhecido por todos, como ocorre na série, no quarto episódio, sendo considerado um nobre ao lado da rainha. Sua presença como bruxo só é revelada após a chegada do pai de Ciri, Duny. Nessa parte da narrativa, descobrimos que Geralt é uma Criança Surpresa, por isso, sabe explicar o destino de Pavetta e como ele está nas mãos dela.

 

04. FLORESTA DE BROKILON

 

Quando Ciri tem por volta de seis anos, ela acaba se perdendo na Floresta das dríades por tentar fugir de um casamento arranjado por sua avó. Nessa época, Geralt é contratado para entregar uma importante mensagem de um rei para a senhora dessas terras – que a recusa. Numa coincidência do destino, Geralt salva Ciri. Nesse momento, eles criam um laço inquebrável.

Ciri não passa pelos acontecimentos em Brokilon, como ocorre no quarto episódio da série, após a invasão e queda de Cintra, mas muitos anos antes. Nessa época, ela pede para ficar com Geralt, no entanto, o bruxo recusa o pedido, devolvendo-a para Myszowor (Mousesack, no inglês). O druida o avisa que o destino não pode ser quebrado ou rompido e que, uma hora, ele teria de aceitar ficar com Ciri.

 

05. MORTE DE MYSZOWOR (MOUSESACK)

 

Prefiro não me estender no absurdo dessa cena, presente no quinto episódio, mas, basicamente, nada disso acontece. Eu não sei de onde a produção tirou isso.

 

06. PASSADO DE YENNEFER

 

Uma das melhores partes da série – e sem sombra de dúvida a parte que é melhor no seriado do que nos livros – é o arco de Yennefer. No decorrer da saga literária, conhecemos muito pouco de seu passado, somente pistas aqui e acolá, como os resquícios de sua aparência anterior e comentários sarcásticos de outras feiticeiras. Ao contrário da obra de Sapkowski, a produção da Netflix apostou na presença acertada da personagem e dessas pequenas pistas e fragmentos.

Contudo, a relação entre ela e Istredd não aparenta ser da maneira que foi apresentada na série. Inclusive, deve-se destacar que, nos livros, Yennefer se relaciona com Geralt e o feiticeiro ao mesmo tempo, sem nunca ter sido recusada por ele. A relação fica tão complexa, com o desejo por estabilidade por parte de Istredd, que ele e Geralt optam por um duelo para saber quem ficaria com Yennefer. Geralt, no fim, vai embora sem duelar.

 

07. PRESENÇA DE TRISS MERIGOLD

 

Tris Merigold é uma personagem muito importante nos livros e, mais ainda, nos jogos, sendo conhecida, nesta plataforma, pelo seu relacionamento amoroso com Geralt. No entanto, nos livros, somente a conhecemos quando Tris Merigold é chamada a Kaer Morhen para cuidar de Ciri.

No seriado, no terceiro episódio, Geralt e Triss se conhecem tentando eliminar a estrige, filha do rei Foltest, conto inicial das obras de Sapkowski. Contudo, nos livros, ela somente aparece em O Sangue dos Elfos, por mais que fique clara a relação da feiticeira com Vesemir, parece que Triss conhece Geralt por conta da relação do bruxo com Yennefer – e o seduz, mesmo sendo amante de uma das suas melhores amigas.

 

08. A PRESENÇA DOS ANÕES NA CAÇADA AO DRAGÃO

 

Devo dizer que muitas das adaptações nesse conto me deixaram feliz; outras, não fizeram diferença (afinal, temos que entender que é uma adaptação), mas tiveram aquelas que foram pura revolta, como o fato de economizar nos figurantes e fingir que metade dos personagens que deveriam estar lá com o príncipe não estavam. Afinal, quem deixa um príncipe importante ir para uma caçada draconiana com pouca escolta? Nem faz sentido!

No entanto, o que mais me deixou revoltada foi a presença dos anões, principalmente o Yarpen Zigrin, personagem de peso nos livros. Na série, no sexto episódio, os personagens foram enfeitiçados por Yennefer e ficaram imóveis durante toda a batalha; nos livros, conto presente em A Espada do Destino, eles tomam a dianteira e até prendem Geralt, Jaskier e Yennefer por quererem lutar com o dragão. O positivo nisso é que exclui uma parte desnecessária do tratamento que Yennefer recebe; o negativo é que os anões ficaram – literalmente – de fora.

 

09. O ÚLTIMO DESEJO DE GERALT E A BRIGA COM JASKIER

 

A série queria um final épico e emblemático, é possível compreender que ganchos precisam ser lançados para que a atenção fique presa. Contudo, a briga com Jaskier tem pouco sentido – por mais que Geralt perca a cabeça com o amigo (com razão, principalmente, na série, porque exageraram na chatice no Jaskier) –, já que o bardo raramente liga para as reclamações do bruxo. Quando confrontado por Geralt, Jaskier não fica magoado, pelo contrário, põe a culpa no lado antissocial do amigo e ignora o que ele disse.

Por outro lado, na série, vemos outra briga, uma anterior a que acontece com Jaskier e, obviamente, o motivo para o bruxo perder a cabeça: a discussão entre Geralt e Yennefer. Sedenta para ter um filho, mas sem conseguir, ela não gosta de saber que o bruxo tem a oportunidade de cuidar de uma criança e a rechaça. Além disso, a personagem coloca em cheque o sentimento que um nutre pelo outro, colocando culpa no último desejo de Geralt para o djin. Entretanto, nos livros, conto presente em A Espada do Destino, a bruxa não questiona isso e nem de fato se importa, pelo contrário, fica emocionada com o “sacrifício” do bruxo, bem como não há discussão nenhuma no final desse conto, já que Borch (Villentretenmerth) diz que não há o que fazer (em relação a Yennefer ter um filho) e eles terminam o conto juntos.

 

10. PRISÃO EM CINTRA

 

Na série, após a discussão com Yennefer, Geralt entende que precisa ir cuidar de Ciri e protegê-la. Ao chegar em Cintra e reivindicar a Criança Surpresa, a rainha Calanthe o prende, fazendo com que o personagem estivesse em Cintra quando foi atacada por Nilfgaard. Nos livros, nada disso acontece. O máximo que Calanthe faz é dizer que Geralt pode levar Ciri se a reconhecesse entre outras crianças (embora a futura bruxa nem sequer estivesse entre elas), porém, depois, entende a força da Lei da Surpresa e para de rechaçar a presença do bruxo. Contudo, na saga literária, Geralt só entende a importância de Ciri para ele tarde demais, depois que Nilfgaard faz Cintra perecer. Nesse contexto, o bruxo só sabe dos acontecimentos, não está presente neles e nem vai até Cintra verificar.

 

BÔNUS: BATALHA DO MONTE SODDEN

 

Eu fiquei surpresa por eles terem acrescentado a batalha, já que somente sabemos dos seus acontecimentos por alto, quando Geralt encontra os nomes que ficam no Monte Sodden. No entanto, a maior surpresa mesmo foi já apresentarem um dos maiores vilões da saga, Vilgefortz, como de fato vilão, já que ele finge e é considerado um dos salvadores do Monte. Assim, ele era um mistério que só seria esclarecido muito mais à frente, no Golpe de Thanedd.

 

No geral, o trabalho de Lauren Schmidt Hissrich, a diretora, causou em mim mais impressões negativas do que positivas, principalmente, por causa do arco da Ciri. No entanto, há pontos muito bacanas que devem ser elogiados, como a presença do passado de Yennefer.