QUER DICA? #01: 10 FILMES DE HAYAO MIYAZAKI

 

 

Um dos meus diretores e roteiristas favoritos, sem sombra de dúvida, é Hayao Miyazaki. O seu conhecimento de mundo e a sutileza de suas obras é tão exuberante que alcançou o mundo inteiro, como se ele estivesse voando em um dos aviões que seu pai ajudava a construir e nos inundasse, na vida cotidiana, com experiências fantásticas.

Inclusive, devo ressaltar que são esses movimentos gratuitos na obra dele que mais chamam a minha atenção – e a de muitas outras pessoas -, pois, em animações infantis, principalmente as americanas, nós estamos muito acostumados a perceber e receber a personalidade dos personagens de forma muito abrupta em meio a momentos de constante movimento e, também, necessidade narrativa. Não há um momento de pausa, reflexão ou apreciação denso.

Para os japoneses, esse tempo para pausar e apreciar é muito importante e, na obra de Miyazaki, torna-se muito evidente essa importância, pois são nesses momentos que percebemos quem de fato são seus personagens, como de fato eles apreciam o mundo e como o recebem para a sua jornada seguir em frente. São nesses momentos que eu diria que os personagens se fazem, através de um vazio narrativo em que, maravilhosamente, o não-dito é mais dito do que se tivesse sido realmente pronunciado.

Hoje, Miyazaki faz aniversário, mas quem recebeu e ainda recebe (toda vez que vê um filme dele) o presente de sua existência, eu diria, é a humanidade. Por conta disso, nós, do Caneta Tinteiro, resolvemos fazer uma experiência com os nossos desafiantes: resolvemos fazê-los criarem fanfictions – histórias feitas por fãs de obras já existentes – a partir dos mundos retirados diretamente da mente desse diretor/roteirista que tanto (eu, tu, ele(a), nós, vós e eles) amamos.

Então, resolvendo unir o útil e o agradável, eu decidi trazer para vocês uma lista de dez melhores filmes do Miyazaki (anteriormente eram cinco, mas eu não consegui escolher). Obviamente, não excluindo as outras histórias e adaptações dele, visto que há uma expressão artística singular em cada uma de suas narrativas.

ATENÇÃO: ORDEM POR CRIAÇÃO
(não colocamos na ordem de preferência, até porque é impossível)

 

 

O1 –Kaze no Tani no Nausicaa (1984)

SINOPSE: No futuro, depois da Terra ser varrida pela Guerra do Sete Dias de Fogo, a princesa Nausicaa tenta de todas as formas impedir que duas nações entrem em guerra e se destruam em um planeta agonizante.

APONTAMENTO: Eu não vou me estender falando muito sobre cada uma das histórias, até porque não seria justo já dar um parecer sobre uma obra que talvez você – leitor – não conheça, sem que esteja preparado para isso, porém, eu preciso ressaltar aqui que Nausicaa, dentro dessa lista, é a única história adaptada por Miyazaki para roteiro, visto que a ideia começou como um mangá, também de autoria dele.

 

O2 – Tenkuu no Shiro Laputa (1986)

SINOPSE: A jovem órfã Sheeta e seu sequestrador, coronel Muska, estão voando para uma prisão militar quando sua aeronave é atacada por uma gangue de piratas aéreos liderados por Dola. Escapando da colisão no ar através de um cristal mágico em seu pescoço, Sheeta conhece o também órfao Pazu. Juntos, tentam descobrir a cidade mística flutuante de Laputa, enquanto são perseguidos por Muska e os piratas, que cobiçam o tesouro da cidade.

APONTAMENTO: Essa é uma das histórias que eu considero mais delicadas quanto a ligação e construção de laços de personagens, o que mostra o desenvolvimento de Miyazaki sempre tendeu mais para o lado das conexões humanas do que para a ação propriamente em si. Além de tudo, há um visual maravilhoso e repleto de encanto – característica também do diretor e roteirista.

 

O3 – Tonari no Totoro (1988)

SINOPSE: As irmãs Satsuki e Mei se mudam para o campo para ficar mais perto do hospital onde sua mãe está internada. Lá conhecem os Totoros, adoráveis criaturas místicas e alegres, que só podem ser vistas pelas crianças. Com eles, as duas irmãs viverão mágicas aventuras no campo.

APONTAMENTO: As narrativas de Miyazaki sempre me passam uma simplicidade constante e envolvente; e Tonari no Totoro, entre todas as animações que já assisti dele, é a que me passa mais essa impressão. Trabalhando problemas de saúde, amizade e misticismo, Miyazaki fez uma obra que não marca somente crianças, mas também adultos.

 

O4 – Majo no Takkyuubin (1989)

SINOPSE: Kiki é uma jovem bruxa de treze anos, ainda um pouco imatura e teimosa. Ela vai para a costa europeia para aprimorar seus poderes, porém, sua insegurança fará com que ela perca sua mágica. Agora, Kiki terá que vencer seus medos para poder recuperar os poderes.

APONTAMENTO: Eu posso parecer um pouco repetitiva, porém, também quero ressaltar, nessa narrativa, a simplicidade cotidiana e o andamento da trama. Miyazaki não faz enredo-tramas com um aspecto grandioso, pelo contrário, ele sempre elabora o simples e traz, dentro dessa experiência, o extraordinário. Kiki é uma jovem bruxa, mas também é uma criança repleta de inseguranças, incertezas que precisa desbravar em sua independência. Mulheres precisam amadurecer mais rápido que meninos, e Kiki – infelizmente – mostra o quanto isso parece universal.

 

O5 – Mimi wo sumaseba (1995)

SINOPSE: Shizuku, uma estudante que sonha ser uma escritora e decide, durante o verão, ler vinte livros. Mas, curiosamente, todas as edições que Shizuki pegou na biblioteca já haviam sido lidas por um tal de Seiji Amasawa.

APONTAMENTO: Esse é um dos filmes que eu, definitivamente, mais gosto e mais me identifico, pois, como Majo no Takkyuubin, trabalha as inseguranças de uma menina, contudo, essas inseguranças se voltam para as necessidades de escolher um futuro (coisa que não acontece com Kiki porque ela sabe quem quer ser), de se definir por algo que você precisa ser e escolher. Esse filme é, como a tradução para o português fomenta, um sussurro do coração, porque é capaz de atingir você diretamente. Além disso, precisamos ressaltar uma figura dentro da narrativa, a estátua de gato, conhecida por nós como Barão, pois, anos mais tarde, vemos esse maravilhoso gato aparecendo de novo no filme Neko no Ongaeshi (2002). Pois é, Studio Ghibli também é repleto de easter eggs.

 

O6 – Mononoke Hime (1997)

SINOPSE: Um príncipe, em busca de uma cura, luta em uma guerra entre a mata e uma colônia mineira. Nesta aventura ele conhece Mononoke.

APONTAMENTO: Embora Miyazaki tenha começado muito tempo antes com filmes maravilhosos (afinal, eles já apareceram nessa lista), somente em Mononoke Hime, o diretor e roteirista ficou conhecido mundialmente, pois ele foi um dos pioneiros a tratar o tema ecologia e a importância de preservação da natureza com muito esmero, afinco e voltado para o universo infantil. Há muito o que falar desse filme, por isso, é melhor passar para o próximo da lista.

 

O7 – Sen to Chihiro no Kamikakushi (2001)

SINOPSE: Chihiro e seus pais estão se mudando para uma cidade diferente. A caminho da nova casa, o pai decide pegar um atalho. Eles se deparam com uma mesa repleta de comida, embora ninguém esteja por perto. Chihiro sente o perigo, mas seus pais começam a comer. Quando anoitece, eles se transformam em porcos. Agora, apenas Chihiro pode salvá-los.

APONTAMENTO: Uma das coisas mais incríveis em Miyazaki é que, mesmo vivendo em uma cultura extremamente machista, todas as suas histórias têm – impreterivelmente – personagens femininas fortes e marcantes. Em Sen to Chihiro no Kamikakushi, o diretor e roteirista cria uma esfera que remonta a tradição japonesa e a miscigena com essa força feminina. Infelizmente, na tradução portuguesa do nome (A Viagem de Chihiro), nós perdemos e muito o sentido essencial do título (ainda que se mantenha em um plano metafórico), visto que a figura do kamikakushi é um espírito literalmente perdido – como Chihiro, obviamente -, sendo um termo utilizado para se referir a quando uma pessoa morre ou desaparece repentinamente levada por uma divindade irada. A tradução americana, Spirited Away, mantém e muito a essência, inclusive, foi Neil Gaiman que adaptou o roteiro para a versão americana, talvez seja por isso que se manteve tão fiel.

 

O8 – Howl no Ugoku Shiro (2004)

SINOPSE: Uma bruxa lança uma terrível maldição sobre a jovem Sophie transformando-a numa velha de 90 anos. Desesperada, ela embarca numa odisseia em busca do Castelo Andante, onde reside um misterioso feiticeiro que poderá ajudá-la a reverter o feitiço.

APONTAMENTO: Miyazaki, antes de tudo, é um diamante mais esculpido do que bruto desde o início de sua carreira, porém, a lapidação de suas histórias é tão maravilhosa que é impossível não perceber a força de suas críticas mais centrais e como ocorreu o desenvolvimento dele, tanto como roteirista quanto como diretor. Esse desenvolvimento é muito nítido, porém, entre todas as narrativas, sinto-o muito mais em Howl no Ugoku Shiro. Eu sinto o jogo do romance, que ora parece ser central e ora não, como um movimento para reforçar ideias e criticar tantas outras mais, como também desenvolver fortemente a protagonista, Sophie. Eu diria também que, ainda que eu não saiba definir se de fato o romance é o centro de sua história (ideia que eu não levo fé, embora seja vendido assim), essa é uma obra que me lembra muito A Bela e a Fera, no entanto, com a situação às avessas (ou nem tanto).

 

O9 – Gake no Ue no Ponyo (2008)

SINOPSE: O garoto Sousuke encontra um peixinho dourado preso em uma garrafa e decide libertá-lo, sem saber que se trata da deusa do mar Ponyo. Filha de um poderoso mago, ela se comove com a atitude do menino e usa a magia do pai para se transformar em humana. Dessa forma, acredita poder fortalecer a amizade com Sousuke. Porém, a substância de sua poção mágica pode colocar em risco o vilarejo onde mora o menino.

APONTAMENTO: Como comentei em Howl no Ugoku Shiro, que me lembra muito A Bela e a Fera, eu acho também impossível não ver um pouco de A Pequena Sereia em Ponyo – inclusive, o próprio Miyazaki diz ter se inspirado na versão animada pela Disney. Em Ponyo, também conseguimos ver uma inversão dos planos – o mundo humano ganha um brilho extraordinário e incrível para a personagem; enquanto isso, o seu mundo se torna banal e cotidiano, algo que é o completo avesso para o menino Sousuke e o público. Isso ocorre por Ponyo estar tão acostumada com aquele deslumbramento poético trazido no cenário desde sua infância que acaba por não dar importância a ele. Além disso, a própria enredo-trama se assemelha nessa dicotomia e afastamento do mar e da terra, porém, obviamente, como de costume no Miyazaki: envolvendo uma excelente crítica social a respeito da poluição.

 

1O – Kaze Tachinu (2013)

SINOPSE: No interior do Japão, o jovem Jiro Horikoshi sonha em voar em um avião com formato de pássaro. Realizar esse sonho torna-se a meta de sua vida. Durante sua jornada, ele conhece a encantadora Naoko, por quem se apaixona. Porém, quando ela adoece, o destino dele fica incerto.

APONTAMENTO: Esse é o último filme criado por Miyazaki, pois ele se aposentou logo em seguida – o que gerou descontentamento nos fãs (eu, tu, ele, nós, vós, eles – isso mesmo). Ao contrário das narrativas anteriores, esse filme é tanto biográfico, pois trabalha a biografia de Jiro Horikoshi, um famoso engenheiro aeronáutico japonês, e, eu acredito que posso afirmar isso, do próprio Miyazaki, mas, ao mesmo tempo, ele é extremamente metafórico. Quem não conhece a história de vida ou não acompanhou a filmografia toda do diretor e roteirista (ou boa parte dela), talvez não consiga perceber as nuances desse filme e como a ideia de voar é tão importante e central em suas histórias. O filme, que é um problema para muitos, não faz uma contextualização histórica e política, coisa problemática, sim, em um filme que trabalha um engenheiro de guerra, porém, embora trate de Jiro no plano primário, acredito que o filme trate muito mais sobre o amor de Miyazaki pela ideia de voar e, por conta disso, o filme não trabalha nenhum desses aspectos além do essencial, pois ele se volta para o metafórico em diversas medidas, até mesmo nos sonhos. Há uma entrevista maravilhosa dele em que ele comenta a respeito de, desde pequeno, sonhar que está voando – algo que realmente aparece, de alguma forma, em todos os seus filmes -, logo, ao dar asas, literalmente, para isso em um filme que trata especificamente de aviação, ele deu asas para os seus sonhos.

Se me questionarem qual é o meu filme favorito do Miyazaki, eu não irei responder, porque eu realmente não sei escolher. Contudo, posso apontar que vale a pena experienciar (não somente assistir) cada um dos filmes e tirar as suas próprias conclusões a respeito do brilhantismo desse roteirista e diretor que ora é poeta do silêncio, ora é piloto de nossos corações.